sexta-feira, 22 de outubro de 2010

E o Haiti?

Há tempos venho fazendo essa pergunta, e o Haiti? Após todas aquelas catástrofes que assolaram a ilha caribenha será que a ordem foi restabelecida? A ordem jamais conquistada por seus cidadãos? Seus habitantes, como estão? Nunca mais falou-se deles, desapareceram novamente nas águas que o cercam, acabaram seus quinze minutos de fama, os holofotes, antes apontados para aquelas terras, estão expondo uma nova tragédia. Uma tragédia da qual o público ainda não se cansou e que tenha impacto igual ou maior ao que houve. Mas a magnitude da coisa, são eles que fazem. São eles, somos nós. Somos nós.
Pobres e infelizes os haitianos que continuam amargando com desgraças que não fizeram por merecer, pois desde os primórdios de seu povoamento colhem misérias. Pobres os que se iludiram com a esperança de que iriam receber ajuda, de que poderiam melhorar um pouco, somente um pouco, de vida. Foi preciso tudo - que não era nada - reduzir-se a pó para que a população haitiana fosse reconhecida como deveria ser: humana. Por cinco minutos foram, foram tão humanos que findo o tempo destinado a eles foram enterrados, enterrados vivos.
Grande a nossa hipocrisia, nos mostramos comovidos, sensibilizados pela situação retratada e, na época, só falávamos sobre o caso. Quem não demonstrava condolências aos nossos irmãos pobres e pretos era tachado como sem coração, sem alma. Campanhas organizadas às pressas viraram moda repentinamente, tendências de generosidade absoluta surgiram, mas como toda tendência tende à sair de moda, assim como entrou, passou.
Não digo que choro pelos meus companheiros todo dia, alias, nunca chorei. No entanto, sempre que lembro, uma revolta, uma indignação me invade e espanto-me com a sociedade. Me assusto com este mundo que infelizmente, pretendo entrar. Não tenho esperança de mudar nada, não tenho intenção de fazer uma revolução, até porque, estou ciente que entrando neste meio vou ter que em algum momento contribuir com o método imposto. Sei que vou ter que trair os haitianos, vou ter que me trair.
Espero, sinceramente, que um dia, façam algo além de pensar e rezar pelo Haiti. Que não seja preciso nós o colocarmos novamente no centro do mundo, pois afinal, somos caçadores de desgraças, somos informantes da tragédia, sempre buscamos más notícias, e disso, eles não precisam mais. O que há naquela terra em abundância é isto, nem deve ser novidade para os companheiros de lá, os coitados não devem nem aproveitar o tema, de tão desgastado que está, afinal, isso se transformou em banalidade, é comum ou normal.
E o Haiti? Como está esse país? Deem-me notícias irmãos! Um sinal de vida, de fumaça! Digam-me, só para me tranquilizar, que vocês estão vivos! Que não foram submersos realmente pelas águas do mar. Burlem o sistema apenas uma vez! Apareçam!
Não. Não precisa de mais nada. Deixo-lhes em paz, em sua paz miserável. Depois deste, seu país sairá de vez todas de minha cabeça, será esquecido para sempre. O Haiti só será lembrado pelos que nele vivem, mas ai é outra história, outro assunto. Assisto de longe as águas tomarem o lugar da terra que nunca deveria ter existido, da terra desgraçada que um dia teimou em emergir e por isso pagou pela sua ousadia. Lentamente, o Haiti vai acabando, vai morrendo, desaparecendo e faço de conta que não sei de nada, que nunca houve nada e uma hora me conformo com minha própria mentira. Ninguém se lembra mais de nada, não temos mais assuntos para nada e por isso, encerro-me aqui.

"Pense no Haiti
Reze pelo Haiti"