segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Até você, vovó?

Um acontecimento que já marcou muito este ano pra mim e, acho, que não esquecerei tão cedo foi o fato da minha vó pedir para eu arrumar uma namorada. Que isso?! Até minha vó agora! Não que todo mundo me faça este pedido, claro. Mas partindo de uma velhinha de mais de 70 anos, me comove muito. Queria atender este pedido tão carinhoso da senhorinha primogênita das mulheres de minha família, mas, antes de tudo, esclareço aqui, seria realmente só para atender o pedido da velha.
Com todas as pessoas da casa tendo alguém, ainda que não tanto, como parceiro - ou parceira, dependendo do caso -, tenho me sentido meio distante das experiências que eles estão vivendo, ou já viveram. Não digo que estou incomodado, isto seria uma besteira. Mas acho que todos perguntam para si mesmo: quando vai acontecer?
Respondo-lhes aqui: quem poderá saber? Essa questão é, no mínimo, complicada, pois não envolve só uma pessoa. Mesmo porque não estou motivado a correr atrás de ninguém, o que acaba sendo uma má notícia para minha querida vovozinha. Fazer o que vovó?
Em minha defesa, posso argumentar que meu irmão também não namora - sério. Essa é a questão, ele namora, períodos incrivelmente rápidos, uma noite mais ou menos e já termina com a infeliz, fazer o quê? Não encontrou a garota certa. E eu? Nem isso faço. O que agrava, para minha vó, é claro, essa situação.
Apelarei para minha outra forma de defesa, aqui nesta tribuna. Melhor sozinho, em paz, do que aos trancos e barrancos com a parceira. Isso mesmo. Se tem uma coisa que me irrita profundamente, talvez seja porque não tenho, são brigas de casais. Que coisa chata, pelo amor de Deus! Ambos se escolheram pra ficarem juntos, agora agüentem, sem reclamação! Em compensação, para ir por água abaixo minha defesa, os casais daqui de casa podem brigar e tal, mas ainda assim estão juntos, pois é, estou ficando sem alternativas.
Para piorar a situação, não sei nem se devo comentar aqui, mas meus amigos cada vez mais estão se arranjando, não cito ninguém especial, é claro, mas este ficou um bom tempo tentando, e agora parece que vai, faço votos que sim. Enfim, à medida que o tempo a avança, parece que isso vai se tornando uma prioridade em nossas vidas, afinal, ninguém quer ficar pra titia, num é?
Pensando bem, acho que vou começar a tratar de me motivar a correr atrás de alguém, pior que não tenho idéia por onde começo, alguém tem uma sugestão? Ou melhor: alguém se candidata a me ajudar a realizar o desejo de minha vó?

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Antes asmático do que qualquer outra coisa

Asma. Asma. Asma. O próprio nome já me incômoda. As vezes até esqueço que sou asmático, mas numa madrugada, a terceira madrugada do ano, por volta das quatro da manhã é impossível esquecer esse problema. Que azar começar o ano assim, asmático.
Tento me lembrar dos anos em que as crises eram mais constantes, mas eu vou lá lembrar de alguma coisa a essa hora? Eu queria somente dormir, amanhã eu tinha planejado começar o meu ano definitivamente, sendo esta uma segunda-feira, mas não. Não consigo dormir, essa respiração chata, que só os asmáticos – e as irmãs dos asmáticos – sabem como é não deixa.
Falo em irmãs, pois, a pouco minha irmã, não conseguindo dormir devido, provavelmente, a esse barulhinho infernal, me pergunta se tenho certeza que não quero fazer uma inalação. Eu, como macho orgulhoso que sou, respondo que não precisa, não é nada. Cá estou eu com minha macheza acordado respirando feito um tonto.
Além do ruído asmático, também tem o chiado da chuva, eu até gosto de dormir com este, mas hoje, que não consigo dormir também me incômoda. Enquanto espero passar o tempo tento escrever algo que preste, mas pelo tema que escolhi vejo que vai ser um pouco difícil.
Na minha triste condição, lembro-me de um que foi muito além da minha, agora mansa, situação respiratória. Decido, para deixar meu texto um pouco mais substancial buscar referências. Vou a prateleira de livros, retiro o único exemplar que tenho de Manuel Bandeira, leio uns três ou quatro poemas relacionados, corro ao dicionário e estanco.
Segundo o Aurélio, descubro que agora pelas cinco da manhã encaro uma “condição mórbida caracterizada por acessos recorrentes de intensa dispnéia, com respiração ruidosa”. Meu Deus! Não sabia que era grave assim! Cadê minha inalação, Senhor?! Minha irmã têm que acordar neste momento. Imagine, passei minha vida toda deixando isso de lado, como pude até esquecer?! Totalmente apavorado, tomo, quem sabe, a decisão mais importante da minha vida, dar uma espiada no significado da palavrinha nenhum pouco simpática acima.

Dispnéia: sf. Med. Dificuldade de respirar. § disp-néi-co adj.

As..As...Asm... Depois dessa dou-me o direito de encerrar aqui meu texto e ir tentar, apenas tentar mesmo, dormir. Aurélio, faça-me o favor, já são cinco e meia! Ah, agora o nome asma é o que menos me incômoda, pois, como todo mundo, eu acho, prefiro ser chamado de asmático do que dispnéico, mas isso, é claro, nem precisava dizer.

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A mesa

             João Cabral de Melo Neto

O jornal dobrado
sobre a mesa simples;
a toalha limpa,
a louça branca

e fresca como o pão.

A laranja verde;
tua paisagem sempre,
teu ar livre, sol
de tuas praias; clara

e fresca como o pão.

A faca que aparou
teu lápis gasto;
teu primeiro livro
cuja capa é branca

e fresca como o pão.

E o verso nascido
de tua manhã viva,
de teu sonho extinto,
ainda leve, quente

e fresco como o pão.

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Feliz 2011 pra todos!

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Sobre cobras e lagartos

- Filho, olha o sapato que ganhei! É de pele de cobra, de verdade!
Foram mais ou menos estas as palavras que desencadearam as bobagens que aqui trago. O meu estranhamento não foi pelo fato dela ter ganho um sapato, é verdade que nas condições atuais qualquer presente que se ganhe é motivo de festa, mas não sei se ficaria tão contente de ter ganho um sapato de pele de cobra, mesmo hoje.
A felicidade da mulher se assemelhava a de uma menina que ganha de presente a nova barbie fashion alguma coisa que acaba de ser lançada no mercado, em seu rosto havia um sorriso que ia de orelha a orelha. Levava no pé o objeto como se estivesse desfilando sobre uma passarela no mais importante evento de moda do mundo. O sapato a engrandecia.
Dizia toda fora de si que o material era pele de cobra, que entendia do assunto pois já trabalhara numa loja de sapatos, que isso custava uma nota preta. Chique pra caramba. Qual era minha função neste momento? Sorrir, o que mais podia fazer? Um sapato de cobra? Bacana.
Suspeito que o clímax do contentamento dela foi quando toquei as escamas de seu sapato, por insistência sua, é claro. Desculpem as mulheres, e principalmente, as cobras, mas não senti nada demais, não era tão maravilhoso quanto parecia, mas enfim...
Devo ser franco, assim que ouvi as palavras iniciais desta crônica (chamaremos isso assim, ok?), não houve como evitar de pensar: "que dó das cobras". Apesar da fama de ser meio traiçoeira, a acusam (injustamente?) de ser a responsável pela tentação do homem, e toda aquela lenda de como foi condenada a rastejar, blá, blá, blá... mas isso já faz tanto tempo, nem sabemos se realmente é verdade, e mamãe sempre diz que devemos perdoar os outros, não é?
No momento, se bem me lembro, estava sentado frente ao computador (pra variar), e ainda por um tempo ela lançou mais algumas exclamações sobre a cobra do sapato e visto que não fazia muito meu estilo percebeu o pseudo-entusiasmo do filho, então seguiu em seu desfile feliz da vida, procurando uma próxima vítima para dar o bote.
Contudo, esse episódio, aparentemente banal, me deixou duas coisas. A primeira, foi assunto para uma possível reconciliação com a escrita (se der sorte, ainda não esqueci como fazer). A segunda, um tanto a longo prazo no meu caso, mas pode ser que no seu funcione muito bem (o natal está chegando, pense a respeito), dar de presente um sapato de pele de cobra (legítimo, hein!) para uma mulher casada, madura e que necessite de um pouco de felicidade.
Ah, (agora me dirijo especialmente à estas mulheres) caso ganhe de presente um deste, por favor, não esqueça de me contar como foi, prometo mostrar mais interesse em seu sapato e quem sabe até toque suas escamas por livre e espontânea vontade.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

E o Haiti?

Há tempos venho fazendo essa pergunta, e o Haiti? Após todas aquelas catástrofes que assolaram a ilha caribenha será que a ordem foi restabelecida? A ordem jamais conquistada por seus cidadãos? Seus habitantes, como estão? Nunca mais falou-se deles, desapareceram novamente nas águas que o cercam, acabaram seus quinze minutos de fama, os holofotes, antes apontados para aquelas terras, estão expondo uma nova tragédia. Uma tragédia da qual o público ainda não se cansou e que tenha impacto igual ou maior ao que houve. Mas a magnitude da coisa, são eles que fazem. São eles, somos nós. Somos nós.
Pobres e infelizes os haitianos que continuam amargando com desgraças que não fizeram por merecer, pois desde os primórdios de seu povoamento colhem misérias. Pobres os que se iludiram com a esperança de que iriam receber ajuda, de que poderiam melhorar um pouco, somente um pouco, de vida. Foi preciso tudo - que não era nada - reduzir-se a pó para que a população haitiana fosse reconhecida como deveria ser: humana. Por cinco minutos foram, foram tão humanos que findo o tempo destinado a eles foram enterrados, enterrados vivos.
Grande a nossa hipocrisia, nos mostramos comovidos, sensibilizados pela situação retratada e, na época, só falávamos sobre o caso. Quem não demonstrava condolências aos nossos irmãos pobres e pretos era tachado como sem coração, sem alma. Campanhas organizadas às pressas viraram moda repentinamente, tendências de generosidade absoluta surgiram, mas como toda tendência tende à sair de moda, assim como entrou, passou.
Não digo que choro pelos meus companheiros todo dia, alias, nunca chorei. No entanto, sempre que lembro, uma revolta, uma indignação me invade e espanto-me com a sociedade. Me assusto com este mundo que infelizmente, pretendo entrar. Não tenho esperança de mudar nada, não tenho intenção de fazer uma revolução, até porque, estou ciente que entrando neste meio vou ter que em algum momento contribuir com o método imposto. Sei que vou ter que trair os haitianos, vou ter que me trair.
Espero, sinceramente, que um dia, façam algo além de pensar e rezar pelo Haiti. Que não seja preciso nós o colocarmos novamente no centro do mundo, pois afinal, somos caçadores de desgraças, somos informantes da tragédia, sempre buscamos más notícias, e disso, eles não precisam mais. O que há naquela terra em abundância é isto, nem deve ser novidade para os companheiros de lá, os coitados não devem nem aproveitar o tema, de tão desgastado que está, afinal, isso se transformou em banalidade, é comum ou normal.
E o Haiti? Como está esse país? Deem-me notícias irmãos! Um sinal de vida, de fumaça! Digam-me, só para me tranquilizar, que vocês estão vivos! Que não foram submersos realmente pelas águas do mar. Burlem o sistema apenas uma vez! Apareçam!
Não. Não precisa de mais nada. Deixo-lhes em paz, em sua paz miserável. Depois deste, seu país sairá de vez todas de minha cabeça, será esquecido para sempre. O Haiti só será lembrado pelos que nele vivem, mas ai é outra história, outro assunto. Assisto de longe as águas tomarem o lugar da terra que nunca deveria ter existido, da terra desgraçada que um dia teimou em emergir e por isso pagou pela sua ousadia. Lentamente, o Haiti vai acabando, vai morrendo, desaparecendo e faço de conta que não sei de nada, que nunca houve nada e uma hora me conformo com minha própria mentira. Ninguém se lembra mais de nada, não temos mais assuntos para nada e por isso, encerro-me aqui.

"Pense no Haiti
Reze pelo Haiti"